Uber inclui motociclistas da cidade de SP na categoria de viagem com passageiro sem que eles saibam
O g1 realizou testes nesta sexta (6) e sete motoboys aceitaram a corrida sem terem sido avisados de que se tratava de viagem com passageiro. Mais cedo, empresa havia afirmado à Prefeitura de SP que modalidade ‘ainda não está disponível na cidade’. Procurada, Uber ainda não se manifestou sobre a inclusão dos motociclistas.
Reportagem do g1 testou a modalidade Uber Moto — Foto: g1
Após reunião com a Prefeitura de São Paulo nesta sexta-feira (6), a Uber afirmou que a modalidade de viagens de moto para passageiros ainda não está em funcionamento na capital. No entanto, é possível solicitar corridas do tipo pelo aplicativo.
O g1 realizou testes na tarde desta sexta, e sete motoboys aceitaram a corrida sem saber que estavam cadastrados na modalidade. Eles trabalhavam apenas com entregas.
Foi solicitada uma corrida de 1 km no valor de R$ 7 — da sede da Rede Globo, na Avenida Chucri Zaidan, Zona de Sul de São Paulo, até o Shopping Market Place, na mesma avenida.
- Três pilotos compareceram ao local solicitado pelo g1 no app da Uber, todos com baús no banco do passageiro;
- Quatro cancelaram a corrida assim que souberam que se tratava da modalidade para viajar com passageiro;
- Nenhum deles iniciou a corrida.
Em nota, a Uber informou que “a modalidade ainda não está disponível em todos os horários e regiões das cidades”, mas não respondeu aos questionamentos do g1. (leia a íntegra abaixo)
“[A nova modalidade começou ontem, né? Nem me atentei. Agora a gente tem que trazer capacete, né? Eu aceitei a corrida achando que era encomenda”, afirmou um motoboy.
Colaboradores da Uber não sabem que estão cadastrados da modalidade Moto — Foto: Reprodução
“Ah não, moça, eu aceitei porque achei que era para levar encomenda. Só vi agora que aparece como passageiro. Eu nem sabia que estava participando disso, não nos avisaram, nem capacete eu tenho para levar passageiro”, contou um outro motociclista.
Corridas de UberMoto na cidade de SP. — Foto: Veronica Medeiros/ g1 Arte
Estavam presentes à reunião com a Uber representantes da Secretaria da Casa Civil do município, da Secretaria Executiva de Transporte e Mobilidade Urbana (Setram) e do Comitê Municipal de Uso do Viário (CMUV).
Eles discutiram a criação de um grupo de trabalho para entender de que forma a atividade pode ser oferecida de forma legalizada e com a maior segurança possível para todos os envolvidos.
“Os representantes vão analisar o serviço, que ainda depende de regulamentação municipal, com base em estudos e dados, e contará com a ampla participação de empresas interessadas, especialistas e representantes da categoria. A redução do número de óbitos por sinistros no trânsito faz parte do Programa de Metas da Prefeitura”, afirmou o município em nota.
Durante a reunião, a Uber informou para a prefeitura que, na prática, “o transporte de passageiros por motocicleta ainda não está disponível na cidade”. Disse ainda que “responderá formalmente ao ofício da gestão municipal que pediu a suspensão do serviço até que o assunto seja debatido com mais profundidade”.
O que diz a Uber
“As viagens de Uber Moto seguem as regras federais para o transporte privado individual de passageiros, com base na Lei 13.640/2018 e na PNMU, a Política Nacional de Mobilidade Urbana.
A Uber esclarece que o funcionamento de Uber Moto tanto no Rio de Janeiro como em São Paulo não foi alterado, e que a modalidade ainda não está disponível em todos os horários e regiões das cidades, já que a plataforma expande a operação na medida em que equilibra a oferta de motociclistas parceiros disponíveis com a demanda de usuários.
Embora seja uma novidade nessas duas capitais, o Uber Moto foi lançado no país em 2020 e tem sido um produto com uma aceitação excelente nas mais de 160 cidades em que já está presente, incluindo as regiões metropolitanas paulistas e fluminenses que, desde o fim de 2021, têm as viagens com moto pela plataforma. Vale esclarecer também que, assim como viagens de UberX e de táxi são coisas diferentes, Uber Moto e mototáxi são modalidades distintas.
Ao longo desses mais de dois anos de funcionamento no país, o Uber Moto comprovou o seu potencial de facilitar a vida das pessoas, a um preço acessível, oferecendo mais uma opção de deslocamento e de complementaridade da malha de mobilidade urbana. A modalidade oferece também uma nova possibilidade de ganhos para os parceiros que utilizam a plataforma.
Milhões de brasileiros se deslocam todos os dias utilizando motos – próprias ou de terceiros, dirigindo ou como passageiros. A Abraciclo (Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares) estimava uma frota de mais de 30 milhões de motos até o final de 2022.
Ao fazer viagens de Uber Moto, usuários e motoristas parceiros têm à sua disposição os já conhecidos recursos de segurança oferecidos pela plataforma, como o seguro de acidentes pessoais e materiais educativos e podcasts preparados por especialistas em segurança viária. Os conteúdos trazem medidas de segurança com relação ao uso correto do capacete, postura adequada na motocicleta e o respeito rigoroso às normas de trânsito, entre outros temas.
A Uber cumpre a Lei, defende a coexistência de novas opções de mobilidade trazidas pela tecnologia para o benefício de todos e segue à total disposição dos municípios para debater, dialogar e contribuir para a construção de um eventual marco regulatório para essa modalidade, assim como faz em diversas cidades por todo o Brasil”.
Regulamentação
Mototáxi em SP — Foto: Reprodução/ TV Globo
O Uber Moto foi lançado pela empresa na quinta-feira (5) na capital paulista e no Rio. No mesmo dia, a Prefeitura de São Paulo pediu a suspensão imediata do serviço. Especialistas ouvidos pelo g1 afirmam que, antes de começar a funcionar na cidade de São Paulo, o serviço de viagens de moto via aplicativo deve passar por uma regulamentação, devido ao número excessivo de acidentes envolvendo motociclistas na capital.
Para os especialistas, antes de começar a usar o aplicativo de forma profissional, os motociclistas precisam:
- Passar por uma série de cursos sobre a condução de passageiros;
- Aprender a realizar primeiros socorros;
- Entender a regulamentação de trânsito de cada município;
- Passar por verificações periódicas;
- Fazer manutenção da motocicleta;
- Saber pilotar com garupa e passar por testes de habilidade.
Em nota, a empresa informou que já oferece viagens de moto desde novembro de 2020 no Brasil e, em São Paulo, a modalidade está presente na região metropolitana desde o ano passado.
Lei federal
Existe uma lei federal que regulamenta o serviço no país, mas ela pode ser adaptada de acordo com cada município. A lei determina que:
- Tanto mototaxistas quanto motoboys devem ter no mínimo 21 anos;
- Carteira habilitação para motocicletas obtida há pelo menos dois anos e aprovação em curso específico, nos termos da regulamentação do Contran;
- Devem usar coletes de segurança regulamentados pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran).
“A gente tem uma legislação federal, que é a lei 12.009 de 2009, que regulamenta tanto o serviço de motofrete quanto o serviço de mototáxi. Juridicamente, entendo que deveria haver uma regulamentação, antes de o serviço ser implementado, com uma legislação municipal para tratar sobre o assunto”, afirma Marcelo Marques, coordenador da Comissão de Direito de Trânsito da OAB-SP.
Para o advogado, o alto número de acidentes justifica a regulamentação municipal. Entre janeiro e novembro de 2022, foram registrados 16.850 acidentes na capital; desses, 371 terminaram em morte, proporção maior do que com ocorrências envolvendo carros (veja mais abaixo).
“O caminho não é proibir, até porque a gente tem um princípio de liberdade econômica, liberdade de exercício profissional. Acho que o caminho é regulamentar, o que está transportando é uma pessoa, não uma encomenda. No carro já tem um certo risco, mas na moto é potencializado”, afirmou.
Para Flávio Vaz de Almeida, professor do Departamento de Engenharia de Transportes da Escola Politécnica – USP, é necessário ter atenção à vulnerabilidade do veículo que está sendo utilizado para o transporte. “Você acaba expondo o passageiro a um risco muito maior. Se você está em um carro é há uma colisão, é pouco provável que haja uma consequência maior.”
“O fato de você conduzir sozinho, levando um lanche, é muito diferente de você conduzir com uma pessoa na garupa. Não só pela responsabilidade, mas pela própria dinâmica envolvida neste deslocamento”, continua.
O engenheiro de transportes Sérgio Ejzenberg concorda com a necessidade de regulamentação e fiscalização. “O transporte por moto é muito mais letal, mais perigoso, cobra um preço enorme em vidas, em hospitalização, em prejuízo social em desastre familiar”, destacou.
E completou: “As autoridades devem tomar a dianteira e estabelecer as medidas necessárias para manter o maior controle de velocidade e maior controle na prestação de serviço dos motociclistas, de tal forma que minimize a matança”.
Gil Almeida Santos, presidente do Sindicato dos Motoboys, Motoentregadores e Mototaxistas, lembrou que a plataforma trabalha com parceiros – motociclistas que se candidatam ao serviço – que não necessariamente têm o treinamento específico necessário para esse tipo de transporte.
“Não dá pra você pegar uma pessoa despreparada, colocar no trânsito e levar outras pessoas. Ainda mais em um trânsito pesado que nem na cidade de São Paulo.”
Fonte: G1