Juiz condena USP a pagar mais de R$ 500 mil em indenização por morte de aluno em prédio da Poli
Estudante da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Filipe Leme morreu asfixiado em 2019, aos 21 anos, depois que o armário que carregava deslizou e apertou seu pescoço, o deixando sem ar, dentro de um elevador da USP.
O aluno Filipe Leme morreu dentro de elevador da Poli-USP — Foto: TV Globo/Reprodução
A Universidade de São Paulo (USP) foi condenada em primeira instância, na última segunda-feira (31), a pagar mais de R$ 500 mil aos pais de Filipe Varea Leme, aluno de Geografia morto em abril de 2019 enquanto atuava como monitor de informática em um dos prédios da Escola Politécnica (Poli), no campus do Butantã, na Zona Oeste da capital paulista.
Na decisão, o juiz Emílio Migliano Neto, da 7ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo, levou em conta o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) assinado pela então supervisora, no qual a funcionária da USP admite ter sido negligente e contribuído para a morte do rapaz, como reconhecimento de responsabilidade subjetiva, de omissão, por parte da própria universidade.
A sentença prevê o pagamento de uma indenização por danos morais de R$ 250 mil a cada um dos pais, com acréscimo de 1% de juros ao mês (desde o dia do ocorrido) e correção monetária pela inflação. A USP também deverá arcar com custos e despesas gerados pelo processo, assim como pelos honorários advocatícios, valor estabelecido em 10% da quantia total atualizada a ser paga à família de Filipe.
“Pela primeira vez, nesses quase três anos, os pais tiveram uma satisfação do estado, uma resposta reconhecendo a culpa. É como se o Poder Judiciário fizesse algo que a USP não fez”, afirmou o advogado Rogério Licastro Torres de Mello, que defende os interesses da família.
Como a parte condenada, no caso, a Universidade de São Paulo, se trata de um órgão público, a sentença será reavaliada obrigatoriamente em segunda instância. Também cabe pedido de recurso por ambas as partes.
Procurada pelo g1, a USP disse que “é uma instituição comprometida com a missão de expandir os horizontes e melhorar o futuro de cada estudante. Quando uma tragédia como essa nos golpeia, sentimos dor e pesar. Estamos empenhados em manter o apoio à família do aluno Filipe, cuja morte nos deixou e ainda nos deixa inconformados” e que se solidariza com o sentimento da família, mas não se manifestou quanto à condenação desta segunda ou a possibilidade de entrar com pedido de recurso.
O advogado que representa os pais de Filipe no processo disse ao g1 que ainda irá avaliar um possível pedido de recurso, já que o valor inicial da indenização pedida pela defesa era de R$ 998 mil (500 salários mínimos por genitor, na época), e a quantia estabelecida pelo juiz foi quase metade disso. “Esse rapaz vem tendo várias mortes ao longo do tempo, a morte física e a morte moral, que os pais também têm que conviver, como se o menino fosse o culpado pelo próprio óbito”, disse Rogério.
Relembre o caso
O estudante da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) morreu asfixiado em 30 de abril de 2019, aos 21 anos, depois que o armário que carregava deslizou e apertou seu pescoço, deixando-o sem ar, dentro de um elevador da Escola Politécnica (Poli) da USP. Ao chegar ao local, bombeiros, policiais militares e agentes da segurança encontraram Filipe já sem vida.
Mesmo sendo monitor de informática na Poli, Filipe e um colega estavam transportando o móvel de um andar para outro a pedido da supervisora, que não acionou a equipe de manutenção para fazer o serviço.
Apesar de a Polícia Civil ter concluído o inquérito que apurava as causas e eventuais responsabilidades pela morte do estudante sem apontar culpados, o Ministério Público (MP) entendeu que a mulher deveria ser responsabilizada por homicídio culposo, aquele sem intenção de matar.
O entendimento do MP é o de que, ao agir com negligência, a funcionária da universidade “deu causa ao óbito” do aluno, já que havia ordenado aos estudantes que fizessem a mudança no prédio, tirando os dois da função original e os colocando para exercer atividades para as quais não tinham treinamento.
Como o homicídio culposo tem pena menor do que quatro anos de prisão, o pacote anticrime, que entrou em vigor em 2020, estabelece a possibilidade de um ANPPcom a Promotoria, para que o autor de um crime não responda a processo nem seja preso.
Em outubro de 2020, a Justiça homologou o acordo por considerar que o crime que supervisora possa ter cometido foi sem violência ou grave ameaça. Desse modo, não foi ajuizada ação penal contra a funcionária, que deixou de ser denunciada pelo Ministério Público por homicídio culposo. Em troca, a mulher foi sentenciada a prestar serviços comunitários por oito meses.
Nota da USP na íntegra
“A USP acolhe alunas e alunos em seus cursos de graduação, todos os anos, para melhorar a vida de cada um deles e delas. A USP é uma instituição comprometida com a missão de expandir os horizontes e melhorar o futuro de cada estudante. Quando uma tragédia como essa nos golpeia, sentimos dor e pesar. Estamos empenhados em manter o apoio à família do aluno Filipe, cuja morte nos deixou e ainda nos deixa inconformados. A USP se solidariza com o sofrimento da família.”
Fonte: G1