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Família e advogado acusam Metrô de SP de negligência e omissão na morte de idosa espanhola achada com fraturas em túnel de estação

Eles suspeitam que ela se confundiu ou fugiu de assaltantes, foi atropelada por trem e que funcionários não a impediram de entrar em local proibido. Polícia diz que morte foi por ‘politraumatismo’. MP sugere que alguém incitou a mulher ao suicídio, mas parentes discordam.


Pepita Marsal Geraldes (no destaque e no círculo) foi encontrada morta dentro do túnel da estação Santos-Imigrantes do Metrô de SP — Foto: Reprodução/Arquivo pessoal e Polícia Técnico-Científica

Pepita Marsal Geraldes (no destaque e no círculo) foi encontrada morta dentro do túnel da estação Santos-Imigrantes do Metrô de SP — Foto: Reprodução/Arquivo pessoal e Polícia Técnico-Científica

Quase dez meses depois, o caso de uma idosa espanhola encontrada sem vida dentro do túnel da estação Santos-Imigrantes do Metrô, na Zona Sul de São Paulo, continua sem explicações sobre como ela morreu exatamente.

A família da vítima e o advogado que defende os interesses desses parentes suspeitam que Pepita Marsal Geraldes, de 83 anos, possa ter sido atropelada e morta por uma composição do Metrô em 18 de janeiro. Acham que ela se confundir na estação ou ainda fugiu de possíveis assaltantes. Depois que a mulher morreu, ocorreram transferências bancárias da conta dela por meio de PIX: R$ 10 mil foram furtados, segundo parentes (leia mais abaixo).

Eles acusam o Metrô de negligência e omissão por não ter impedido a mulher de passar por uma portinhola e entrar no túnel, onde possivelmente foi atingida. E pretendem entrar na Justiça com uma ação pedindo ao Metrô que pague indenização por danos morais e materiais à família.

De acordo com a Polícia Civil, laudo necroscópico feito pelo Instituto Médico Legal (IML) apontou que Pepita morreu por “politraumatismo” provocado por um “agente contundente”. Fotos mostram que ela teve fratura exposta no crânio: um corte profundo na cabeça, com perda de massa encefálica. E fraturou também a perna esquerda. Além de ter tido outros “hematomas e escoriações” pelo corpo. https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

Apesar disso, o inquérito policial feito pelo 17º Distrito Policial (DP), no Ipiranga, não informa nem confirma se mulher foi atropelada por algum vagão quando entrou no túnel.

Vídeos gravados na estação Santos-Imigrantes mostram o momento que a idosa fica caminhando pela plataforma de embarque e desembarque de passageiros. Em seguida, ela passa pela portinhola. O acesso ao local é proibido para passageiros, sendo permitido seu acesso somente a funcionários autorizados, já que leva a uma área de emergência (saiba mais abaixo).

O g1 teve acesso a fotos da filmagem que mostram Pepita na plataforma e no momento que entra no túnel. Elas foram analisadas pelo Instituto de Criminalística (IC) da Polícia Técnico-Científica (veja abaixo).

Fotos de vídeo mostram que Pepita ficou caminhando pela Estação Santos-Imigrantes  — Foto: Reprodução/Polícia Técnico-Científica

Fotos de vídeo mostram que Pepita ficou caminhando pela Estação Santos-Imigrantes — Foto: Reprodução/Polícia Técnico-Científica

De acordo com a investigação, funcionários do Metrô disseram que, durante a condução de um trem, um operador viu o corpo dela caído próximo aos trilhos da Linha Verde do Metrô, sentido estação Vila Prudente.

O funcionamento das demais composições foi suspenso até que Pepita fosse retirada do local pela equipe. Ela estava vestida com uma blusa cinza, calça preta e usava calçados. Com a mulher estavam um cartão de Bilhete Único em seu nome, um porta-moedas e uma chave.

Pepita estava distante cerca de 148 metros da plataforma. Laudo toxicológico feito na idosa não encontrou vestígios de álcool, drogas ou remédios.

O inquérito, que investigava o caso como “morte suspeita a esclarecer” foi concluído em 4 de outubro sem indicar o que provocou os traumatismos em Pepita e a matou. A polícia não informa no documento nem sequer se ela foi atropelada por algum vagão do metrô, por exemplo.

Procurada para comentar o assunto, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou por meio de nota divulgada por sua assessoria de imprensa que “o caso foi investigado pelo 17° DP (Ipiranga) e relatado à Justiça no dia 4 de outubro deste ano, sem responsabilidades criminais.”

MP suspeita de suicídio

Prédio do Ministério Público de São Paulo no centro da capital paulista — Foto: Reprodução/GloboNews

Prédio do Ministério Público de São Paulo no centro da capital paulista — Foto: Reprodução/GloboNews

Ao receber e analisar o relatório da investigação, o Ministério Público (MP) sugeriu que alguém incitou Pepita a se suicidar, o que configura crime. Por esse motivo, o inquérito foi encaminhado para o Tribunal do Júri, que apura crimes dolosos contra a vida.

Apesar disso, a Promotoria não indica quem possa ter incitado a idosa a se matar nem como isso teria ocorrido. A pena para este crime é de 2 a 6 anos de prisão em caso de condenação.

Até a última atualização desta reportagem, o MP não havia respondido os questionamentos do g1, entre eles, se a Promotoria pediu que a polícia volte a investigar o caso para apontar quem é suspeito de supostamente incitar a idosa ao suicídio.

Fotos feitas a partir dos vídeos do Metrô, que mostram Pepita na estação, registraram outros passageiros próximos a ela. Mas como as gravações não têm áudio, não é possível saber se eles conversaram algo que possa ter levado ela a querer se matar. Também não há imagens de ninguém empurrando a mulher, que entrou sozinha no túnel.

Por meio de nota, a promotora Fernanda Martins Fontes Rossi, que sugeriu que o caso possa ter sido de incitação ao suicídio, informou que se manifestou nos autos “e, ante a hipótese de possível suicídio, encaminhei para a PJ [Promotoria de Justiça] do Tribunal do Júri para análise. Não posso fazer essa análise quanto à suposta incitação ao suicídio. Cabe à PJ do Tribunal do Júri tal exame”.

Fotos feitas a partir do vídeo do Metrô mostram Pepita Geraldes ao fundo da plataforma de embarque (no círculo em vermelho) durante a passagem da composição e depois ela não aparece mais quando o trem passa — Foto: Reprodução/Polícia Técnico-Científica de SP

Fotos feitas a partir do vídeo do Metrô mostram Pepita Geraldes ao fundo da plataforma de embarque (no círculo em vermelho) durante a passagem da composição e depois ela não aparece mais quando o trem passa — Foto: Reprodução/Polícia Técnico-Científica de SP

Polícia não cita suicídio

A tese de suicídio levantada pelo MP não está no relatório final da polícia. O documento apenas informa que a mulher morreu por um trauma e foi encontrada sem vida na linha do Metrô.

Um funcionário da estação ouvido pela investigação chegou a dizer que “não é comum a ocorrência de suicídio no local onde o corpo da vítima foi localizado e sim em outras áreas”.

O único filho de Pepita, um comerciante de 59 anos, também refutou a possibilidade de que a mãe possa ter se matado. Em seu depoimento à polícia, ele falou que a idosa “não realizava nenhum tratamento de saúde e tampouco fazia uso de medicamentos antidepressivos”.

A mulher morava com o marido, de 85 anos, na casa do filho, na Vila Prudente, também na Zona Sul. No imóvel ainda moram a neta de Pepita e dois bisnetos. A idosa havia nascido na Espanha, mas veio ao Brasil na adolescência. Depois se casou.

“Somos uma família pequena, mas feliz. Minha avó não tinha motivo para querer se matar, se jogando na frente de um trem do Metrô ou nos trilhos da estação. Ela estava muito feliz, tinha acabado de completar 60 anos de casamento. Por isso não cogitamos suicídio”, falou a médica veterinária Larissa Geraldes, de 34 anos, neta da idosa. “Era bastante religiosa, fazia parte de um grupo hindu que abomina alguém tirar a própria vida.”

Entidade religiosa da qual Pepita Geraldes fazia parte a homenageou nas redes sociais — Foto: Reprodução/Facebook

Entidade religiosa da qual Pepita Geraldes fazia parte a homenageou nas redes sociais — Foto: Reprodução/Facebook

“A gente queria tentar entender o que aconteceu porque estamos desnorteados. As fotos do vídeo mostram que ela fica perambulando pela plataforma, como estivesse perdida ou procurando alguém. Não sei se ela teve algum esquecimento e foi procurar algo nesse túnel”, disse Larissa.

De acordo com os parentes, ocorreu outra situação estranha após a morte de Pepita: o sumiço de R$ 10 mil da conta conjunta que ela tinha com o marido.

“Isso aconteceu 15 dias depois que ela morreu. Foram vários PIX para várias contas. Muito estranho. Ainda bem que o banco ressarciu. Não sei se tem relação com a morte dela. Cabe à polícia investigar isso”, falou a neta.

Advogado da família fala em confusão e fuga de assaltantes

Advogado Ariel de Castro Alves  — Foto: Roney Domingos/g1

Advogado Ariel de Castro Alves — Foto: Roney Domingos/g1

Na opinião do advogado Ariel de Castro Alves, que defende os interesses da família de Pepita no caso, o Metrô tem de ser responsabilizado pela morte da idosa. Primeiro porque, segundo ele, não existem portas automáticas de embarque e desembarque na estação para a chegada do trem; depois, porque os funcionários não impediram a mulher de passar pela portinhola e entrar no túnel.

“Provavelmente foi atropelada pelas composições do Metrô, conforme a gravidade das lesões, constatadas nos laudos”, disse Ariel, que cobra o uso de portas automáticas nas plataformas de embarque para evitar o risco de quedas nos trilhos. “Principalmente de crianças, pessoas com deficiência e idosos.”

Segundo o advogado, por essas falhas na prestação de serviços, o Metrô tem de indenizar a família da vítima.

“O Metrô, como empresa prestadora de serviços, deve garantir a vida e a integridade física de seus consumidores e usuários. O que não aconteceu. Por falta de segurança e portas automáticas nas plataformas, por falta de funcionários nas plataformas e estações e por falta de atenção dos funcionários que atuam na central de controle e monitoramento das câmeras e imagens”, disse ele, que pretende entrar com uma ação na Justiça por danos materiais e morais.

Ainda de acordo com Ariel, a polícia precisa esclarecer se Pepita foi alvo de criminosos na plataforma, antes do acidente, já que depois da sua morte ocorreram saques indevidos de sua conta bancária. “O que poderia ter também contribuído para a queda dela, no caso de ter tentado fugir de assaltantes, ou ter ficado nervosa e em desespero, ou mesmo ter sofrido ameaças.”

Por meio de nota divulgada por sua assessoria de imprensa, o Metrô informou que “colaborou com a investigação policial e está à disposição para qualquer esclarecimento à Justiça”.

Justiça condenou Metrô em caso parecido em 2018

Justiça condena Metrô a pagar indenização à família de menino morto em 2018

Justiça condena Metrô a pagar indenização à família de menino morto em 2018

Ariel é o mesmo advogado que defendeu os interesses da família de Luan Silva de Oliveira, de 3 anos, que foi atropelado e morto por um vagão da composição do Metrô em 23 de dezembro de 2018 em São Paulo.

Em 2020, a Justiça aceitou o pedido da defesa dos parentes do menino e condenou o Metrô a pagar indenização de R$ 200 mil e dar uma pensão vitalícia aos pais de Luan. O entendimento é o de que a empresa foi omissa pela falta de segurança na estação Santa Cruz. Cabe recurso da decisão.

Câmeras de segurança gravaram quando a criança escapou da mãe (veja vídeo acima). A mulher havia se distraído e não conseguiu impedir o filho de sair sozinho do vagão na Linha 1-Azul, na Zona Sul da capital.

As imagens também mostram o momento em que Luan foge da mãe e sai correndo pela porta do vagão, indo até a plataforma de embarque e desembarque. Depois, o menino passa por um portão destravado e entra num túnel, onde foi atropelado e morto por outra composição.

Fonte: G1

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