Juiz acusado de violência física, sexual e psicológica pela mulher: perguntas e respostas sobre o caso
Ministério Público de São Paulo investiga o caso. Defesa afirmou que Valmir Maurici Júnior, juiz de direito da 5ª Vara de Guarulhos, na Grande São Paulo, nega ‘veementemente todas as acusações’.
Por g1 — São Paulo
Mulher obtém medida protetiva após acusar juiz de violência física, sexual e psicológica
A mulher do juiz Valmir Maurici Júnior, da 5ª Vara Cível de Guarulhos, na Grande São Paulo, acusa o marido de violência física, sexual e psicológica. O caso foi revelado pelo g1, que obteve vídeos que mostram as agressões, ocorridas na casa em que os dois moravam, em Caraguatatuba, no Litoral Norte de SP.
A defesa do juiz nega “veementemente os fatos que lhe são imputados” (veja resposta na íntegra mais abaixo). O g1 procurou Maurici Júnior por meio de mensagem no celular, mas não obteve resposta.
A seguir, leia perguntas e respostas sobre o caso.
- Como eles se conheceram e qual a situação do casal?
- O que a mulher relata sobre a violência física, sexual e psicológica?
- O que diz a defesa do juiz?
- O que mostram os vídeos?
- Quando aconteceu a denúncia?
- Por que a sogra também obteve uma medida protetiva na Justiça?
- Por que o juiz registrou um BO de furto?
- Como estão as investigações no Ministério Público?
- O que diz a Corregedoria Nacional de Justiça?
- O que dizem TJSP e SSP?
1. Como eles se conheceram e qual a situação do casal?
A vítima e Maurici Júnior se casaram em 2021. A mulher, de 30 anos, diz que saiu de casa em 23 de novembro; o casal está em processo de separação. A violência começou depois dos seis primeiros meses de relação, segundo a defesa dela.
2. O que a mulher relata sobre a violência física, sexual e psicológica?
Em entrevista ao repórter Giovani Grizotti no dia 27 de dezembro, a vítima contou que conheceu o juiz em outubro de 2020. À época, segundo a mulher, ele vivia em Santa Catarina, e ela, no interior de São Paulo. Em dezembro de 2021, ela se mudou para Caraguatatuba, no litoral norte de São Paulo, para morar com Maurici Júnior.
“Eu conheci ele quando ele me mandou uma mensagem pelas redes sociais e me convidou para jantar. […] E ele era uma pessoa encantadora. Parecia um príncipe (…) eu fiquei muito apaixonada”, disse.
A relação dos dois, segundo ela, começou a ficar violenta aos poucos, o que a fez querer o fim da relação:
“Ele sempre falou do sexo com força, mas eu não entendia o que era isso. Eu sofri todo tipo de violência com ele. Violência sexual, moral, física, psicológica. Ele usava de vários mecanismos para me deixar confusa. Ele falava: ‘é só dar um tapa’. Eu consegui perceber que saiu do contexto sexual quando eu tava na cozinha, fazendo alguma coisa, ele me dava um tapa na cara, puxava meu cabelo”, afirmou.
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3. O que diz a defesa do juiz?
A defesa do juiz nega “veementemente os fatos que lhe são imputados”.
“A defesa técnica do magistrado, por seus advogados Marcelo Knopfelmacher e Felipe Locke Cavalcanti, nega veementemente os fatos que lhe são imputados e repudia com a mesma veemência vazamentos ilegais de processos que correm em segredo de Justiça.”
O g1 procurou Maurici Júnior por meio de mensagem no celular, mas não obteve resposta.
4. O que mostram os vídeos?
O g1 obteve vídeos que mostram as agressões, ocorridas na casa em que os dois moravam em Caraguatatuba. Em um dos vídeos, o juiz dá um tapa na cabeça da esposa.
Já em outra gravação, ele dá empurrões, um chute e xinga a esposa, enquanto ela cai no chão. Os vídeos foram gravados com um celular da vítima, em outubro de 2022, segundo ela.
Em um terceiro vídeo, de abril de 2022, aparentemente gravado pelo próprio juiz, ele a submete a uma relação sexual — segundo ela, não consentida por não ter tido opção de escolha.
É possível ver, em outro vídeo, um bilhete. “Ali ele descreveu vários motivos para eu ser castigada por coisas que eu fiz e que deixou ele irritado”, disse a mulher ao g1.
Perguntada pela reportagem sobre um exemplo, ela respondeu: “Não pegar o carrinho grande no supermercado e pegar o pequeno. Então, eu merecia apanhar por aquilo, por eu ter escolhido o carrinho pequeno, quando ele mandou eu pegar o grande. Ele nunca me pedia nada, ele mandava”.
5. Quando aconteceu a denúncia?
A mulher procurou uma Delegacia da Mulher em dezembro. Pouco antes, em 23 de novembro, ela saiu de casa.
Em janeiro, ela obteve medida protetiva na Justiça, com base na Lei Maria da Penha, que proíbe o juiz de se aproximar e de manter contato com a mulher e com pais e familiares dela. Na mesma decisão, o juiz também foi obrigado a entregar a arma a que tem direito por ser magistrado.
6. Por que a sogra também obteve uma medida protetiva na Justiça?
A sogra do juiz afirmou que foi ameaçada pelo genro. Assim como a filha, a mulher também obteve uma medida protetiva na Justiça.
Tanto a mulher quanto a sogra do juiz conseguiram a medida protetiva com base na Lei Maria da Penha, em janeiro deste ano. A medida impede que Maurici Júnior se aproxime ou mantenha contato com a família da esposa.
A sogra relatou ainda que assistiu aos vídeos que mostram as agressões que a filha sofreu.
“Está sendo difícil. Eu tive que assistir aqueles vídeos e ouvir aqueles áudios mais de 20 vezes porque eu não consegui acreditar”, disse.
7. Por que o juiz registrou um BO de furto?
Ao sair de casa, a mulher levou consigo um cofre que, segundo ela, Maurici Júnior mantinha no escritório da casa. O fato de a vítima ter levado o cofre da casa do casal fez Valmir Maurici Júnior acusar a esposa de furto qualificado.
O boletim de ocorrência foi registrado pelo juiz no dia 30 de novembro na Polícia Civil em Caraguatatuba.
O advogado Luciano Katarinhuk, que defende a mulher, diz que a casa era dela também, porque ambos viviam juntos, e que não houve furto. O material do cofre foi encaminhado para perícia pelo Ministério Público.
8. Como estão as investigações no Ministério Público?
O Ministério Público de São Paulo abriu investigação sobre o caso.
O g1 apurou que o MP trata “os fatos noticiados” como “gravíssimos” e que o juiz “demonstrou comportamento violento, manipulador, desviado, e que potencialmente colocaria em risco” a integridade da vítima e dos seus parentes. No mesmo parecer, o MP trata a mulher como “vítima” e o juiz, como “investigado”.
O procedimento está no Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, órgão responsável por casos do tipo de acordo com a Lei Orgânica da Magistratura.
9. O que diz a Corregedoria Nacional de Justiça?
Após a reportagem do g1 publicada nesta segunda-feira (27), a Corregedoria Nacional de Justiça, órgão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), informou que vai avaliar se afasta o juiz.
“A Corregedoria Nacional de Justiça abriu reclamação disciplinar para avaliar as repercussões administrativas do caso e analisar a necessidade do afastamento do juiz do exercício das funções. Os fatos noticiados pela imprensa correm na esfera criminal. O processo está em segredo de justiça”, informou o CNJ.
A Corregedoria do CNJ disse que dará um prazo de cinco dias para o juiz prestar esclarecimentos sobre os vídeos.
A Corregedoria-Geral do estado de São Paulo e o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Ricardo Mair Anafe, também foram intimados a prestar informações em cinco dias, ainda de acordo com o CNJ.
10. O que dizem TJSP e SSP?
- Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP)
“A assessoria de Imprensa do Tribunal de Justiça de São Paulo, em relação à solicitação de informações, esclarece se tratar de Procedimento Investigativo Criminal que, dada a natureza do feito, tramita em segredo de Justiça.
O desembargador relator — sorteado dentre os integrantes do Órgão Especial — responsável pela condução do procedimento, já determinou a extração de cópias e remessa à Corregedoria Geral da Justiça, para adoção das providências administrativo-disciplinares que se entenderem cabíveis”.
O TJSP disse ainda que Valmir Maurici Júnior não está trabalhando. Questionada se o juiz foi afastado ou está em licença médica, a assessoria de imprensa do Tribunal não respondeu.
- Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP), sobre o inquérito aberto em que juiz acusa a esposa de furto qualificado
“O caso segue em investigação pela Delegacia de Polícia de Caraguatatuba. A autoridade policial realiza a oitivas de testemunhas e diligências para esclarecer todas as circunstâncias dos fatos.”
Fonte: G1