Socorrista do Samu diz que família não queria que paciente fosse atendido por ela: ‘Ela é negra’, ‘tudo bem, ela está com luvas

Caso ocorreu no último dia 12 de março durante atendimento a um idoso com sequelas de AVC. Socorrista Laura Cristina Cardoso disse que ‘a vítima foi devidamente atendida pelas minhas mãos negras enluvadas’.


Enfermeira Laura Cristina Cardoso, do Samu, em unidade de atendimento em São Paulo (SP) — Foto: Arquivo pessoal

Enfermeira Laura Cristina Cardoso, do Samu, em unidade de atendimento em São Paulo (SP) — Foto: Arquivo pessoal

A socorrista Laura Cristina Cardoso, do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), afirmou que a família de um paciente não queria que ele fosse atendido por ela durante um atendimento no último dia 12, na região central de São Paulo. Nesta segunda-feira (21), é comemorado o Dia Internacional de Luta contra a Discriminação Racial.

Em nota, a A Prefeitura de São Paulo, por meio do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), disse que “lamenta o ocorrido e repudia qualquer caso de discriminação, com cunhos racistas e preconceituosos” (veja a nota completa abaixo).

Laura, que é enfermeira da Unidade de Suporte Intermediário, contou que atendia a um chamado para socorrer um idoso que passava mal quando familiares do paciente fizeram os comentários.

“A senhora ficou meio desesperada e gritou: “E agora, filho? Ela é negra.” Aí, o filho respondeu: “Tudo bem, mamãe. Ela está usando luvas”, contou a enfermeira.

Laura contou que a mulher do idoso se assustou quando ela entrou no quarto para fazer os primeiros atendimentos. A socorrista disse que ficou chocada com o que ouviu, mas preferiu não reagir. Ela disse que só pensou em salvar o idoso que precisava ir para um hospital. O homem tem 90 anos e estava com rebaixamento do nível de consciência.

Em uma postagem nas redes sociais, ela contou sobre o ocorrido e disse que “a vítima foi devidamente atendida pelas minhas mãos negras enluvadas”.

“Naquela hora, vendo aquele idoso passando mal, o que eu vou responder para uma pessoa dessa? Também não reagi por causa do meu juramento. O juramento da Enfermagem é proteger a vida desde a concepção até a morte. E eu faço isso. Protejo a vida. Mesmo a vida dos racistas. Qualquer outra atitude poderia colocar a vítima em risco”, disse Laura.

“Então é respirar fundo, trincar os dentes e seguir em frente. Se você está perguntando por que essas pessoas receberam o melhor tratamento possível, eu respondo: quem elas são não muda quem eu sou”, disse Laura.

Enfermeira Laura Cardoso, ao centro, com outros socorristas do Samu  — Foto: Arquivo pessoal

Enfermeira Laura Cardoso, ao centro, com outros socorristas do Samu — Foto: Arquivo pessoal

Antes de iniciar o atendimento ao idoso, a equipe também foi questionada por familiares sobre a presença de um médico entre os socorristas, segundo o relato de Laura.

A enfermeira contou ainda que essa não foi a primeira vez que ela foi agredida verbalmente. “Pedem para a gente entrar pelo elevador de serviço, não tocar nos pacientes. Isso é muito comum”, contou.

Laura não denunciou o crime. O advogado Fernando Brito disse que mãe e filho podem responder pelo crime de injúria racial. O crime é previsto no Código Penal, o qual estabelece punição de 1 a 3 anos de reclusão e multa para quem ofende a dignidade de outra pessoa utilizando elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, entre outros.

Discriminação contra enfermeiros

Segundo dados do Conselho Regional de Enfermagem e da Articulação Nacional da Enfermagem Negra, boa parte dos enfermeiros e técnicos em enfermagem que se declaram pretos ou pardos disse que já sofreu preconceito.

Enfermeira negra manipula vacina para o vírus H1N1 da gripe — Foto: Carla Carniel/Código 19/Estadão Conteúdo

Enfermeira negra manipula vacina para o vírus H1N1 da gripe — Foto: Carla Carniel/Código 19/Estadão Conteúdo

Dentre os que trabalham em São Paulo, 64% dos entrevistados relataram que já perceberam racismo dentro da unidade de saúde onde eles trabalham, e 55% por cento disseram que a discriminação veio dos pacientes que eles estavam atendendo.

A maioria, 84%, não vê nenhuma prática antirracista no ambiente de trabalho.

Veja a nota da Prefeitura de SP:

A Prefeitura de São Paulo, por meio do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), informa que lamenta o ocorrido e repudia qualquer caso de discriminação, com cunhos racistas e preconceituosos. Casos deste tipo devem ser tratados com a máxima seriedade e em todos os âmbitos.

As providências necessárias estão sendo tomadas e o Samu encoraja e estimula os profissionais para que, em casos como esse, sejam notificados de imediato às chefias e às autoridades competentes.

Fonte: G1

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