69% dos homens e 63% das mulheres no Brasil dizem que não são violentos, mas revidam se forem agredidos, diz Ipec

Pesquisa feita com o Instituto Patrícia Galvão mostra também que 37% de homens e mulheres dizem não levar desaforo para a casa. ‘A pessoa sempre tem uma justificativa para sair da condição pacífica para a agressão’, diz especialista.


Maioria da população brasileira considera que brigar não vale a pena, mas não leva desaforo para casa — Foto: Marcos Serra Lima/G1

Maioria da população brasileira considera que brigar não vale a pena, mas não leva desaforo para casa — Foto: Marcos Serra Lima/G1

A grande maioria da população brasileira considera que brigar não vale a pena, condena essa forma de resolver conflitos interpessoais, mas revida se for agredida mesmo não se considerando uma pessoa violenta. É o que mostra uma pesquisa inédita feita pelo Ipec e o Instituto Patrícia Galvão, com apoio da Uber, obtida com exclusividade pelo g1 e o Jornal Hoje.

O levantamento “Percepções sobre controle, assédio e violência doméstica: vivências e práticas” foi realizado para compreender a perspectiva dos brasileiros sobre esses temas que envolvem práticas invasivas, assédio e violência.

Foram entrevistadas 1.200 pessoas em todo território nacional (800 homens e 400 mulheres) entre 21 de julho e 1º de agosto deste ano. Todos maiores de 16 anos. A margem de erro é de três pontos percentuais para mais ou para menos.

Do total de entrevistados, 92% dos homens e 85% das mulheres declararam que brigar não vale a pena. Mas, quando questionados sobre serem agredidos, 69% dos homens e 63% das mulheres dizem que não são violentos, mas revidam.

Além disso, 37% afirmaram não levar desaforo para casa, na mesma proporção para homens e mulheres.

A concordância com essa afirmação é maior (53%) entre jovens de 16 a 24 anos de ambos os sexos, atingindo 56% entre os homens dessa faixa etária.

“O que esses dados mostram é que a maioria da população afirma que brigar não vale a pena, que brigar é coisa de gente sem argumento. Nesse primeiro momento, todo mundo é de paz. Mas aí você entra no campo pessoal de que ‘eu sou de paz, mas eu não levo desaforo para casa’, ‘se eu for agredido, eu vou revidar’, afirma Marisa Sanematsu, diretora de conteúdo do Instituto Patrícia Galvão.

“Os dados nos deram essa percepção de que as pessoas estão quase no limite. A pessoa sempre tem uma justificativa para sair da condição pacífica para a agressão. Todo mundo diz que briga por legítima defesa. Então, em teoria, a briga é de gente que não tem argumento para dialogar, mas a partir do momento que a pessoa se sente agredida, ela não quer dar a outra face. Ela quer revidar”.

Pesquisa inédita realizada pelo Instituto Patrícia Galvão e Ipec, com apoio da Uber — Foto: Arte/g1

Pesquisa inédita realizada pelo Instituto Patrícia Galvão e Ipec, com apoio da Uber — Foto: Arte/g1

O psicólogo Alexandre Coimbra ressalta também o fato das pessoas sempre justificarem a agressão.

“Os homens não se acham violentos, mas acham prudente e legítimo revidar se eles forem agredidos. Essa é a grande questão, porque é o conceito deles de ser agredido que é o grande problema”.

“São frases que começam com ‘mas você’. Então, por exemplo, uma mulher é estuprada e escuta de outro homem, às vezes até de uma força policial, por exemplo: ‘mas você também estava de minissaia’, ‘mas você também me provocou’, ‘eu te bati, mas você também me provocou.’ Então, o homem se coloca sempre como essa pessoa que está sendo provocada pelo outro e que não tem nada a fazer a não ser revidar. A deturpação é no conceito de provocação”.

Em 7 de agosto deste ano, uma briga terminou com a morte do campeão mundial de jiu-jítsu Leandro Lo, em São Paulo. Ele morreu após ser baleado na cabeça durante um show no Clube Sírio pelo policial militar Henrique Otávio de Oliveira Velozo, que se entregou à Corregedoria e está detido no presídio militar Romão Gomes.

A defesa do policial militar afirmou ao g1 em 15 de agosto que o oficial agiu por “defesa” depois que foi cercado por seis lutadores.

Já a defesa de Leandro ressalta que o lutador teve uma discussão com o policial e, para acalmar a situação, imobilizou o homem. Após se afastar, o agressor sacou uma arma, atirou uma vez na cabeça do lutador e deu dois chutes em Leandro antes de fugir.

O campeão mundial de jiu-jítsu, Leandro Nascimento Lo Pereira, de 32 anos.  — Foto: Reprodução/Instagram

O campeão mundial de jiu-jítsu, Leandro Nascimento Lo Pereira, de 32 anos. — Foto: Reprodução/Instagram

A pesquisa aponta também que 17% dos entrevistados tiveram alguma briga séria de 2020 até 2022. Mais mulheres (20%) do que homens (14%) dizem ter se envolvido em pelo menos uma briga séria com outra pessoa, com agressões verbais ou físicas.

Adultos de 25 a 34 anos, os não heterossexuais, os moradores de capitais e os das grandes cidades se envolveram mais em brigas sérias, aponta o levantamento.

Vítima agressão, violência — Foto: Marcos Serra Lima/g1

Vítima agressão, violência — Foto: Marcos Serra Lima/g1

Em abril deste ano, imagens compartilhadas nas redes sociais que mostram uma briga entre clientes no Bar do Cuscuz, em Boa Viagem, na Zona Sul do Recife, viralizaram. A confusão no estabelecimento aconteceu durante a transmissão do jogo do Sport contra o Fortaleza.

A Polícia Militar foi acionada por um homem, que disse ter sido agredido enquanto acompanhava o jogo e logo após comemorar um gol do time pernambucano.

Segundo o relato feito à corporação, a confusão começou minutos depois da comemoração, quando outro cliente do bar se aproximou e desferiu um murro.

Confusão foi registrada durante jogo Sport x Fortaleza em bar em Boa Viagem, na Zona Sul do Recife, na quinta-feira (31) — Foto: Reprodução/WhatsApp

Confusão foi registrada durante jogo Sport x Fortaleza em bar em Boa Viagem, na Zona Sul do Recife, na quinta-feira (31) — Foto: Reprodução/WhatsApp

Parceiros

Outro dado do levantamento é que as mulheres relatam mais brigas com atuais ou ex-parceiros (52%), diferente dos homens que afirmaram brigar mais com familiares (32%).

Recortando-se por sexo e raça, nota-se que 41% das mulheres brancas e 60% das mulheres negras declararam haver brigado com atuais ou ex-parceiros, enquanto 11% dos homens brancos e 44% dos homens negros afirmaram haver brigado com atuais ou ex-parceiras.

“Esses dados nos mostram que a violência no âmbito doméstico é muito grande. As mulheres relatam mais frequente a violência do parceiro. Homens relatam mais briga com familiares (mãe, pai, sogro, sobrinho). Mas nos faz pensar se os homens não relataram brigas com parceiras por naturalizarem a violência”, diz Marisa.

Fonte: G1

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *